Feminismo radical
Dentro do feminismo burguês, na primeira fase do movimento de mulheres nos séculos XIX e princípios do liberalismo no século XX, o feminismo radical foi a ideologia dominante: na fase contemporânea do feminismo radical, o movimento de mulheres teve um forte impacto, e de muitas maneiras, porém de forma difusa, muitas ideias e posições podem remontar ao debate feminista radical. Em contraste com o enfoque pragmático adotado pelo feminismo liberal, o feminismo radical se destina a remodelar a sociedade e a reestruturar suas instituições, vistas como inerentemente patriarcais. Proporcionando a teoria fundamental para o feminismo moderno, as radicais argumentaram que o papel subordinado da mulher na sociedade estava estreitamente tecido na teia social [socialização], que pode ser desenredada sem uma transformação revolucionária da própria sociedade. Esforçaram-se para suplantar as relações de poder hierárquicas e tradicionais (que viam como um reflexo de uma inclinação masculina), com enfoque não-hierárquico e antiautoritário à política e à organização.Na segunda fase do feminismo, nos Estados Unidos, as feministas radicais surgiram dos movimentos sociais da década de 1960 (o movimento pelos direitos civis, o novo movimento de esquerda e o movimento pela paz contra a guerra do Vietnam). Eram mulheres que não estavam satisfeitas com o papel designado a elas nestes movimentos e com a forma com que a nova esquerda abordou a questão da mulher em seus escritos, teóricos e populares. Ao mesmo tempo, nenhuma delas queria preservar o sistema vigente. Assim, em sua fase inicial, os escritos eram um debate com o marxismo, uma tentativa de modificar ou de reescrever o marxismo. Mais tarde, quando o movimento feminista radical se fortaleceu, o marxismo foi posto de lado, e toda atenção se deslocou para uma análise do sistema sexo/gênero e do patriarcado como sistema desligado do sistema capitalista. Nesta fase contemporânea de atenção, o feminismo se centrou nas origens da opressão das mulheres e muitos livros foram escritos teóricos para tentar analisar as formas de opressão da mulher e o rastrear das raízes desta opressão. Contudo, algo que se deve levar em conta, é que em toda sua escritura, elas mantém apenas sua própria sociedade em mente.
Parte daí toda sua crítica, descrição e análise dos acordos com as sociedades capitalistas avançadas (EUA especificamente). Em 1970, Kate Millet publicou o livro “A política sexual”, onde desafiou a noção formal da política e apresentou uma visão mais ampla das relações de poder entre os homens e as mulheres na sociedade. Daí que o livro intitule-se “Política sexual”. Aqui ela afirmou que o pessoal é o político, o que se converteu em lema popular do movimento feminista. “O pessoal é o político” equivalia dizer que o descontentamento que cada mulher sente em sua vida não se deve a algo individual, mas ao sistema social, que tem mantido as mulheres na subordinação e opressão de muitas maneiras. Seus sentimentos pessoais são, portanto, questão política.
De fato, ela modificou a visão materialista histórica, afirmando que a relação homem-mulher é um marco para todas as relações de poder na sociedade. Segundo o feminismo radical, estas “classes sociais” (os homens a classe social opressora, as mulheres a classe social oprimida e subordinada) substituem todas as outras formas de desigualdade, seja racial, política ou econômica. Esta é a situação humana primária. Estas outras maneiras de opressão continuarão porque adquirem a legitimidade lógica e emocional da opressão nesta situação primária. O patriarcado, segundo ela, é o controle masculino sobre o mundo público e privado. De acordo com ela, para eliminar o patriarcado, deve-se eliminar o gênero, quer dizer, a condição sexual, o papel e o temperamento, já que foram construídos sob o patriarcado. A ideologia patriarcal exagera as diferenças biológicas entre homens e mulheres e subordina as mulheres. Millet advoga por uma nova sociedade, que não se baseie no sistema sexo/gênero e onde os homens e as mulheres sejam iguais. Ao mesmo tempo, afirma que deve-se avançar lentamente para isto, eliminando as características indesejáveis, como a obediência das mulheres e a arrogância dos homens. O livro de Kate Millet foi muito influente durante muito tempo. Outra escritora influente foi Soulamith Firestone, que argumentou em seu livro “Dialética do sexo” (1970) que as origens da subordinação das mulheres e a dominação dos homens jaziam nas funções reprodutivas de homens e mulheres. Neste livro, ela reescreve Marx e Engels.
Engels havia escrito sobre o materialismo histórico da seguinte maneira: “é a visão do curso da história que busca a causa íntima e a grande mobilização de todos os eventos históricos no desenvolvimento econômico da sociedade, nas mudanças do modo de produção e troca, na divisão da sociedade em classes distintas e na luta destas classes entre si”.
Firestone reescreveu da seguinte maneira: “o materialismo histórico é a visão do curso da história que busca a causa última e a grande mobilização de todos os eventos históricos na dialética do sexo: a divisão da sociedade em duas classes claramente biológicas para a procriação e a reprodução, e as lutas destas classes entre sí; nas mudanças no modo de matrimônio, na reprodução e no cuidado dos filhos, criados por estas lutas; no desenvolvimento de outras classes conectadas fisicamente e diferenciadas (castas); e na divisão do trabalho baseado no sexo que se desenvolveu no sistema (econômico-cultural) de classes”.
CRITICA
Firestone se centrou na reprodução no lugar da produção como a força motriz da história. Além disso, em vez de identificar as causas sociais da condição da mulher, deu ênfase às razões biológicas para sua condição e as converteu em forças motrizes da história. Pensava que o fato biológico das mulheres poderem ter filhos seria a base material para a posição das mulheres na sociedade e que era necessária uma revolução biológica e social para efetivar a libertação humana. Também tinha a opinião de que a diferença sexo/gênero deve ser eliminada e que os seres humanos devem ser andróginos. Mas foi mais além que Kate Millet na solução. Advogou por colocar fim à opressão das mulheres, dizendo que a menos que as mulheres renunciassem ao seu papel reprodutivo e já não tivessem filhos e que, portanto, a base existente da família se transformasse, não seria possível libertar completamente a mulher.Para tanto, segundo ela, a menos que a reprodução natural fosse substituída pela reprodução artificial, e que a família tradicional fosse substituída pela família intencional, as divisões biológicas entre os sexos não seriam eliminadas. A família biológica é a família em que os membros estão conectados geneticamente (pais e filhos), enquanto que a família intencional significa uma família escolhida por amizade ou conveniência. Ela acreditava que se esta mudança ocorresse, não existiriam os diversos complexos de personalidade que se desenvolvem na sociedade atual. Outras escreveram acerca de como se deu o primeiro conflito social entre homens e mulheres. O homem caçador era propenso à violência e subjugou a mulher através do estupro (Susan Brownmiller).
Estes escritos refletem o tom do movimento feminino em seu setor mais radical, que não se contentava com os esforços das feministas liberais em mudar as leis e fazer campanhas para tais questões. Exigiram que se insistisse na posição tradicional da mulher quanto ao papel reprodutivo, na questão das diferenças de gênero/sexuais e na questão da própria estrutura da sociedade como patriarcal, hierárquica e opressiva. Queriam uma transformação total da sociedade. Assim, as feministas radicais viam a si próprias como revolucionárias em vez de reformistas. O ponto fundamental que defendem é que o sistema sexo/gênero é a causa da opressão das mulheres. Consideraram a relação homem-mulher de forma isolada do resto do sistema social, como uma contradição fundamental. Como resultado de toda sua orientação, direção de análise e ação, ocupam-se fundamentalmente desta contradição, e isto lhes conduziu ao separatismo. Ao centrar-se no papel reprodutivo da mulher, tornam as relações sexuais e familiares em objetivos centrais de seu ataque para transformar a sociedade.
Sistema sexo-gênero e patriarcado
O ponto central na compreensão feminista radical é o sistema sexo/gênero. De acordo com uma definição popular dada por Gayle Rubin, o sistema sexo/gênero é um “conjunto de disposições mediante as quais uma sociedade transforma a sexualidade biológica em produtos da atividade humana”. Isto significa que a sociedade patriarcal utiliza certos fatos acerca da fisiologia masculina e feminina (sexo) como base para a construção de um conjunto de identidades masculinas e femininas e de comportamento (de gênero) que servem para capacitar homens e mulheres, ou seja, como deve ser um homem e como deve ser uma mulher. Esta, segundo elas, é a base ideológica da subordinação das mulheres. A sociedade é de alguma maneira convencida de que estas características de condutas determinadas culturalmente são “naturais”. Portanto, afirmam que o comportamento “normal” depende da habilidade de cada indivíduo de mostrar a identidade de gênero e o comportamento que a sociedade relaciona com o sexo biológico de cada pessoa.Inicialmente as feministas radicais, por exemplo o grupo de Boston ou o grupo radical de Nova Iorque, confirmaram as visões de Kate Millet e de Firestone, e se centraram nas formas como o conceito de feminilidade, as funções e as responsabilidades reprodutivas e sexuais (criação dos filhos, etc), servem para limitar o desenvolvimento das mulheres como pessoas completas. Assim, advogaram pela androginia. Androginia significa ser tanto homem como mulher, ter características tanto do homem como da mulher, para que os papéis de sexo não se perpetuem. Isto significa que as mulheres devem adotar algumas características masculinas (e os homens algumas características femininas). Porém mais tarde, em finais dos anos 1970, uma seção de feministas radicais rechaçou o objetivo da androginia, pois pensavam que isto significava que as mulheres deveriam aprender algumas das piores características da masculinidade. Em vez disso, propõem que a mulher deve afirmar sua “feminilidade”. As mulheres devem tratar de ser mais como mulheres, ou seja, dar ênfase às virtudes da mulher tais como a independência, a comunidade, a conexão, o partilhar, a emoção, o corpo, a confiança, a ausência de hierarquia, a natureza, a imanência, o processo, a alegria, a paz e a vida. Daqui em diante, toda sua atenção se torna separatista; as mulheres apenas deveriam relacionar-se com mulheres, deveriam construir uma cultura e instituições de mulheres.
Com isso mudou inclusive sua compreensão acerca da sexualidade e elas acreditaram que as mulheres deveriam converter-se em lésbicas, apoiando as relações lésbicas e monogâmicas como o melhor para as mulheres. Politicamente converteram-se em pacifistas. A violência e a agressão são, segundo elas, características masculinas que devem ser rechaçadas. Afirmam que as mulheres são naturalmente amantes da paz e doadoras da vida. Com a construção de instituições alternativas elas acreditavam estar trazendo a mudança revolucionária. Começaram a construir clubes de mulheres, realizavam filmes de mulheres e outras formas de cultura separada para mulheres. Em sua compreensão, a transformação revolucionária da sociedade será levada à cabo de forma gradual. Esta corrente é chamada feminismo cultural porque se centra por completo no aspecto cultural da sociedade. Elas não relacionam a cultura à estrutura político-econômica da sociedade. Contudo, isto se converteu na principal tendência do feminismo radical e se entrelaça com o eco-feminismo e com o pós-modernismo. Entre as feministas culturais destacam-se Marilyn French e Mary Daly.
Sexualidade: heterossexualidade e lesbianismo
Dado que as relações homem-mulher são a contradição fundamental para as feministas radicais, elas têm investido uma grande quantidade de atenção às relações sexuais entre homens e mulheres. A sexualidade se converteu no palco da maioria das discussões e debates que se concentram no feminismo radical. A postura das igrejas cristãs no ocidente, em relação a diversos temas como o sexo e a postura com o aborto, tem sido extremamente conservadora. Isto ainda mais em países como EUA, França e Itália. A moral cristã tem defendido relações sexuais apenas depois do matrimônio e se oposto ao aborto. As teóricas feministas radicais, ao mesmo tempo que enfrentavam isto, expuseram como na sociedade patriarcal, dentro das relações sexuais (inclusive no matrimônio) as mulheres geralmente percebem um sentimento de dominação.É neste contexto em que as questões da repressão sexual, da heterossexualidade compulsória, da homossexualidade ou da escolha sexual, se converteram em temas de discussão e debate. As feministas radicais defendem que em uma sociedade patriarcal, nas relações e nas práticas sexuais, a dominação masculina prevalece. Isso tem sido qualificado como repressão pela primeira corrente e ideologia de objetificação sexual pelas feministas culturais. Segundo elas, o sexo é visto como algo mal, perigoso e negativo. O único sexo permitido e considerado aceitável é a prática heterossexual civil. Há a pressão na sociedade patriarcal para ser heterossexual e as minorias sexuais, como lésbicas, travestis e transexuais, são consideradas inaceitáveis. O prazer sexual, uma poderosa força natural, é controlado pela sociedade patriarcal, separando as práticas sexuais consideradas sãs de práticas ilegítimas.
Mas as duas correntes têm compreensões muito diferentes da sexualidade, o que afeta as demandas que fazem e as soluções que oferecem. Segundo as feministas radicais, a repressão sexual é uma das mais cruas e irracionais formas das forças da civilização para controlar o comportamento humano. A permissividade é o melhor para os homens e para as mulheres. As feministas culturais, ao contrário, consideram que as relações heterossexuais se caracterizam por uma ideologia de objetificação onde os homens são os chefes/sujeitos e as mulheres são as escravas/objetos. “A heterossexualidade tem certas similitudes com o colonialismo, em particular em sua manutenção, através da força quando o paternalismo é rechaçado, e na representação da dominação como algo natural e na desqualificação das mulheres” (Sarah Hoagland Lucia).
É uma forma de violência sexual masculina contra as mulheres. Assim, as feministas devem opor-se a qualquer prática sexual que normaliza a violência sexual masculina. Segundo elas, as mulheres devem recuperar o controle sobre sua sexualidade mediante o desenvolvimento do interesse sobre suas próprias prioridades sexuais que diferem das prioridades dos homens. As mulheres, afirmam, desejam a intimidade e o cuidado ao invés da performance. Assim, defenderam que as mulheres devem rechaçar as relações heterossexuais e tornarem-se lésbicas.
Além disso, as radicais acreditavam que as mulheres deviam buscar seu prazer, de acordo com Gayle Rubin, sem regras. Para as feministas culturais, a heterossexualidade trata da dominação masculina e da subordinação feminina e é por isso que existe a pornografia, a prostituição, o assédio sexual e os maus-tratos às mulheres. Defenderam assim que as mulheres deviam renunciar às relações heterossexuais e entrar em relações lésbicas, onde existe implicação emocional.
As feministas culturais enfatizaram a necessidade de desenvolver a “feminilidade” essencial da mulher. O lesbianismo foi impulsionado no movimento feminino do Ocidente em princípios da década de 1980, mas começou a retroceder alguns anos depois. A solução oferecida pelas feministas culturais é acabar com a subordinação das mulheres, rompendo a relação sexual entre homens e mulheres, com as mulheres formando uma classe separada. A primeira tendência advoga pelas relações sexuais livres, desvinculadas de qualquer implicação emocional, seja com homens ou mulheres.
De fato, a solução que propõem é transformar as relações pessoais íntimas em um tipo de comodidade baseada em relação impessoal. Daí a apoiar a pornografia e a prostituição é um passo. Enquanto as feministas culturais se opuseram firmemente à pornografia, as radicais não estavam de acordo com que a pornografia tivesse um impacto negativo na forma como os homens veem as mulheres. Por sua vez, defendem que a pornografia poderia ser utilizada para superar a repressão sexual. Mesmo em questões de tecnologia reprodutiva, as duas partes se diferem. Enquanto as radicais apoiavam a tecnologia reprodutiva, as culturais se opuseram à ela. As feministas culturais defendiam que as mulheres não devem renunciar à maternidade, já que este é o único poder que possuem. Estiveram ativas nos debates éticos levantados sobre tecnologia reprodutiva, como os direitos da mãe de aluguel ou biológica.
Crítica
Desde a perspectiva dada é óbvio que as feministas radicais têm pisoteado o marxismo, por assim dizer. Vamos abordar os argumentos de Firestone na seção sobre as feministas socialistas, mas alguns pontos devem ser mencionados. Em seu entendimento das condições materiais, foi tomado o aspecto físico e biológico da mulher como o fundamental de sua análise, concluindo que esta é a razão da opressão das mulheres. Marx escreveu que a produção e a reprodução da vida são as duas condições básicas para a existência humana. A reprodução compreende tanto a reprodução da pessoa no dia à dia como a reprodução da espécie humana. A reprodução das espécies é algo que o ser humano partilha com o reino animal. Assim, esta não poderia ser a base da opressão das mulheres. Por todos os milhares de anos que as pessoas viveram nas primeiras etapas de sua existência, as mulheres não estavam subordinadas ao homem. De fato, seu papel na reprodução se celebra e lhe é dada importância devido à sobrevivência da espécie e à dependência do grupo em relação à reprodução. A importância dada à fertilidade e aos rituais de fertilidade, que sobreviveram na maioria das sociedades tribais, são o testemunho deste fato.O marxismo entende que as condições materiais se adaptam, por isso a posição das mulheres mudou. A mudança significativa nas condições materiais veio com a geração do excesso de superprodução. Esta superprodução é a questão do surgimento das classes; tal superprodução passa a pertencer a um pequeno grupo de pessoas na comunidade. O papel da mulher na reprodução explica a razão para que no princípio tivesse um estado mais elevado e terminasse escravizada. O clã/família à que pertenciam seus filhos se tornou importante, encontrando restrições e o surgimento da família patriarcal, onde a mulher ficou subordinada ao cuidado dos filhos.
As feministas radicais trataram superficialmente o desenvolvimento histórico e os fatos históricos, e impuseram sua própria compreensão da contradição entre homem-mulher como a contradição original e principal que determinou o curso da história real. A partir deste ponto, a análise feminista radical abandona por completo a história, ignora a estrutura político-econômica e se concentra apenas nos aspectos sociais e culturais da sociedade capitalista avançada e projeta a situação de seu país como a condição humana universal. Esta é outra grande debilidade em suas análises e enfoques. Como tomaram a relação homem-mulher (relação gênero/sexual) como a contradição principal na sociedade, segundo sua análise, os homens se convertem nos principais inimigos da mulher. Já que não possuem nenhuma estratégia concreta para superar esta sociedade, mudam toda sua análise para uma crítica aos aspectos da superestrutura – a cultura, a linguagem, os conceitos, a ética – sem preocuparem-se com o capitalismo e com o papel do capitalismo na manutenção das relações de gênero e, portanto, tampouco pensam na necessidade de incluir a derrocada do capitalismo para sua estratégia para a libertação da mulher.
Enquanto as suas críticas à estrutura patriarcal são extremamente fortes, as soluções que dão são, de fato, reformistas. Suas soluções se baseiam na mudança de papéis, características, atitudes, valores morais e na criação de uma cultura alternativa. Praticamente isso significa que as pessoas podem, em certa medida, renunciar a certos valores, os homens podem renunciar a características agressivas por serem reconhecidas como características patriarcais, as mulheres podem passar a ser mais audazes e menos dependentes. Mas quando toda a estrutura da sociedade é patriarcal, até onde podem chegar estas mudanças sem a derrocada de todo o sistema capitalista, é uma questão que absolutamente não abordam. Assim terminam convertendo-se em pequenos grupos que buscam mudar seus estilos de vida, suas relações interpessoais, o enfoque no interpessoal em vez de em todo o sistema. Apesar de iniciarem através de uma análise de todo o sistema e com desejo de mudá-lo, a linha de sua análise as levou às vias reformistas. A libertação da mulher não é possível desta maneira.
A culpa é de sua própria análise. As feministas culturais têm dado um passo além, enfatizando as diferenças essenciais entre machos e fêmeas e afirmando que as inclinações e os valores característicos da fêmea (não femininos) são desejáveis. Este argumento dá maior importância à base biológica das diferenças entre masculino e feminino que à educação social. Tal argumento é, de fato, contraproducente, porque as forças conservadoras da sociedade sempre utilizaram este tipo de argumento (chamado determinismo biológico) para justificar a dominação sobre um setor da população. Os escravos eram escravos porque teriam aquelas características e se descartava que pudessem cuidar de si próprios. As mulheres são mulheres e os homens são homens porque basicamente são diferentes, por isso os papéis sociais das mulheres e dos homens também são diferentes. Este é o argumento que usam as forças conservadoras reacionárias, para oporem-se à libertação da mulher.
Este argumento tem perigosas implicações e pode recuara luta das mulheres. A masculinidade e a feminilidade são construções realizadas em uma sociedade patriarcal e temos que lutar para mudar estas rígidas construções. Mas para isso há que se fazer ruir toda a sociedade exploradora. Em uma sociedade onde a dominação patriarcal deixe de existir, como homens e mulheres serão, que tipo de características adotarão, é impossível dizer. As características que os seres humanos adotarão depois, estarão em consonância com o tipo de sociedade existente, já que não pode haver uma personalidade humana fora do marco social. Buscar esta feminilidade é como perseguir uma miragem e auto enganar-se.
Ao fazer da heterossexualidade o ponto central de suas críticas ao atual sistema que encoraja o separatismo lésbico, conduzem o movimento de mulheres a um beco sem saída. À parte de formarem as pequenas comunidades de lésbicas e construírem uma cultura alternativa, elas não puderam e não poderão ser capazes de dar um passo à frente para libertar as massas de mulheres da exploração e da opressão que sofrem. Não é prático tampouco natural pensar que as mulheres podem ter uma existência completamente separada dos homens. Com isso abandonaram completamente o objetivo de construir uma sociedade humana melhor. Esta estratégia não serve à grande massa de mulheres.
Objetivamente se converteu em uma distração da construção de um amplo movimento pela libertação da mulher. A tendência radical, através do apoio à pornografia e dando o argumento abstrato da liberdade de escolha, deu um giro reacionário que justifica o apoio à indústria do turismo sexual promovida pelos imperialistas e que está submetendo as mulheres das comunidades étnicas oprimidas e do Terceiro Mundo à exploração sexual e incalculável sofrimento. Ao criticar os hipócritas costumes sexuais repressivos da burguesia reacionária e da igreja, a tendência radical tem promovido uma alternativa única que distancia mais os seres humanos entre si e degrada a mais íntima das relações humanas. Separar o sexo da intimidade e do amor, torna as relações humanas mais mecânicas e inumanas.
Seus argumentos ainda estão absolutamente isolados das circunstâncias reais da vida das mulheres e de suas amargas experiências. Maria Mies fez uma crítica de toda esta tendência que resume a debilidade do enfoque: “A crença na educação, na ação cultural ou inclusive na revolução cultural como agentes de mudança é uma crença típica da classe média urbana. Com respeito à questão da mulher, se baseia na suposição de que a opressão da mulher não tem nada a ver com as relações básicas ocidentais, em particular nos EUA, onde geralmente as feministas não falam em capitalismo. Para muitas feministas ocidentais, a opressão da mulher tem suas raízes na cultura da civilização patriarcal. Para elas portanto, o feminismo é em grande parte um movimento cultural, uma nova ideologia, uma nova consciência…” (1986).
Este feminismo cultural que dominou o feminismo ocidental, influenciou também o pensamento feminista nos países do terceiro mundo. Se une assim à tendência pós-moderna e desvia toda a orientação do movimento de mulheres de ser uma luta para mudar as condições materiais da vida das mulheres para uma análise de “representações” e símbolos. Se opõem à ideia de que a mulher se converta em uma força militante porque enfatizam que a natureza da mulher não é violenta. Elas estão assim ignorando o papel que as mulheres têm desempenhado nas guerras contra a tirania ao longo da história. As mulheres devem seguir e seguirão desempenhando um papel ativo nas guerras justas destinadas a acabar com a opressão e a exploração. Portanto, serão ativas participantes na luta por mudança.
Em resumo, podemos ver que a tendência feminista radical tem levado o movimento de mulheres a um beco sem saída ao defender o separatismo para mulheres.
As principais debilidades na teoria e no enfoque são:
- Tomam uma posição filosoficamente idealista, dando grande importância às características de personalidade e aos valores culturais mais que às condições materiais. Ignoram a situação material no mundo e centram-se unicamente nos aspectos culturais.
- Tomam a contradição entre homem e mulher como a contradição principal, assim justificam o separatismo.
- Tornam o fato natural da reprodução na razão da subordinação das mulheres, e rechaçam as razões socioeconômicas da condição social da opressão, reforçando desta maneira a perspectiva conservadora, o argumento de que homens e mulheres são diferentes por natureza.
- Tornam a natureza do homem e da mulher imutável.
- Ignoram as diferenças de classe entre as mulheres, e as necessidades e os problemas das mulheres pobres.
- Ao propagar a natureza da mulher como não-violenta, desencorajam as mulheres a tornarem-se combatentes na luta por sua emancipação e pela emancipação da sociedade.
- Apesar de se afirmarem radicais apresentam soluções completamente reformistas e não podem levar a libertação das mulheres adiante.
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