O feminismo e o pós-modernismo
A crítica às feministas por parte de mulheres não-brancas conduziu uma seção feminista em direção ao multiculturalismo e ao pós-modernismo. Partindo da escritora existencialista Simone de Beauvoir, consideram que a mulher é a “outra” (em oposição à cultura dominante prevalecente, por exemplo, Dálits, Advasis, mulheres, etc). As feministas pós-modernas glorificam a posição da “outra”, já que se supõe que devem ter uma visão onde não sejam parte da cultura dominante. Portanto, as mulheres são críticas das normas, dos valores e das práticas impostas a todos pela cultura dominante. Acreditam que os estudos devem estar orientados a partir dos valores das que estão sendo estudadas, as subalternas que foram dominadas. O pós-modernismo é popular entre os acadêmicos. Acreditam não existir uma categoria fixa, neste caso, a mulher. O eu é fragmentado em diversas identidades – sexo, classe, casta, comunidade étnica, raça. Estas diversas identidades possuem um valor em si mesmas, portanto, isto se converte em uma forma de relativismo cultural.Assim, por exemplo, não existe nenhuma categoria de mulher única. A mulher pode ser uma das identidades do eu, havendo outras também. Haverá uma mulher dálit, uma mulher dálit prostituta, uma mulher de casta superior, e coisas semelhantes. Dado que cada identidade possui um valor em si, nenhuma importância é dada aos valores para os quais todos podem esforçar-se. Visto deste modo, não há nenhuma possibilidade de encontrar um terreno comum para a ação coletiva. O conceito mulher ajudou a reunir as mulheres para atuarem coletivamente, mas este tipo de política de identidades mais divide do que une. A unidade está na base mais estreita.
As pós-modernas celebram a diferença e a identidade e criticam o marxismo por focar em uma “totalidade” – classe. O pós-modernismo também não acredita que a linguagem (ao menos as línguas ocidentais) reflita a realidade. Acreditam que as identidades são “construídas” através do “discurso”. Assim, muitas delas têm se centrado na “desconstrução” da linguagem,efeito que leva a pessoa ao nada – não há realidade material sobre a qual possamos estar seguros. Esta é uma forma de subjetivismo extremo. As feministas pós-modernas têm focado na psicologia e na linguagem. O pós-modernismo, de acordo com o famoso filósofo francês Foucault, vai contra o que eles chamam “relações de poder”, mas este conceito é difuso e não está claramente definido.
Quem detém o poder? De acordo com Foucault, isto se dá apenas ao nível local, assim a resistência ao poder pode ser apenas local. Não é isto a base do funcionamento das ONGs que unem as pessoas contra um poder corrupto local e fazem ajustes com o poder anterior, os governos central e estadual? Com efeito, o pós-modernismo é extremamente divisivo, já que promove a fragmentação entre as pessoas e dá importância relativa às identidades sem um marco teórico para compreender as razões históricas da formação da identidade e para vincular as diversas necessidades. Podemos então ter um grupo similar a uma ONG, onde todo mundo celebre sua identidade – mulheres, prostitutas, homossexuais, lésbicas, tribais, dálits, etc, etc, mas não há uma teoria que mantenha uma compreensão global, uma estratégia comum. Cada grupo resistirá aos seus próprios opressores, da forma que os percebem. Com este argumento, logicamente, não pode haver nenhuma organização, no máximo apenas uma organização espontânea a nível local e com coalizões temporárias. Advogar por uma organização, de acordo com sua compreensão, significa reproduzir a força – a hierarquia, a opressão. Essencialmente, deixam ao indivíduo que resista por sí mesmo, e colocam-se contra a resistência organizada, consistente e a resistência armada.
CaroleStabile, uma feminista marxista, tem razão quando diz: “o cunho anti-organizativo é parte integrante do pacote pós-modernista. Organizar qualquer das mais provisórias e espontâneas coalizões são, para os teóricos sociais pós-modernos e feministas parecidas, reproduzir a opressão, a hierarquia e as formas intratáveis de dominação. O fato de que o capitalismo está muito organizado não faz muita diferença, porque cada um resiste contra uma forma difusa e polivalente de poder. Tampouco, como Joreen assinalou há mais de duas décadas, não parece importar que a falta de estrutura produza suas próprias formas de tirania. Assim, em vez de qualquer política organizada, a teoria social pós-moderna nos oferece variações sobre o pluralismo, o individualismo, a agência individualizada, e em última instância, soluções individualistas que não são – e jamais serão – capazes de resolver problemas estruturais” (1997).
Não é de se estranhar que para as pós-modernas, o capitalismo e o imperialismo não signifique nada mais que mais uma forma de poder. Apesar do pós-modernismo, em sua forma desenvolvida, não ser encontrado em uma sociedade semicolonial como a Índia, muitas feministas burguesas têm sido influenciadas por ele. A crítica veemente das feministas às organizações revolucionárias e revisionistas no terreno da burocracia e da hierarquia também reflete a influência do pós-modernismo nos últimos tempos.
Resumo
Apresentamos brevemente as principais correntes teóricas nos movimentos feministas que se desenvolveram no Ocidente na época contemporânea. Enquanto o debate com o marxismo e dentro do marxismo dominou a década de 1970, na década de 1980 o feminismo cultural, com sua agenda separatista, concentrou-se nos aspectos culturais da opressão da mulher e colocou isto em primeiro plano. As questões da escolha sexual e do papel reprodutivo das mulheres chegaram a dominar o debate e as discussões nos círculos feministas. Muitas feministas socialistas também têm dado importância a estas questões, porém não da forma extrema que as feministas culturais fazem. A transformação da família heterossexual se converteu na principal consígna do movimento feminista burguês e as seções mais ativas entre elas trataram de levar tal consígna para a prática também. Enquanto muitas delas previram uma mudança em todo sistema social desta maneira, nos fatos, se converteu em uma perspectiva reformista, que trataram de teorizar.
O pós-modernismo fez sentir sua influência na década de 1990. Porém, em finais de 1990 o marxismo está se convertendo de novo em uma teoria importante dentro da análise feminista. Após esta visão crítica da maneira pela qual o movimento feminista (em particular as tendências feminista radical e feminista socialista) analisa a opressão da mulher, as soluções que têm oferecido e as estratégias que têm desenvolvido para levar o movimento adiante, podemos dizer que os defeitos em sua teoria levaram a defender soluções que têm conduzido o movimento a um beco sem saída. Apesar do enorme interesse gerado pelo movimento e do apoio amplo de mulheres que tratavam de compreender suas próprias insatisfações e problemas, o movimento não pôde converter-se em um movimento de ampla base consistente incluindo não só as classes médias, mas também as mulheres da classe trabalhadora e de setores etnicamente oprimidos.
As principais debilidades em sua teoria e estratégias foram:
– Buscar as raízes da opressão da mulher em sua função reprodutiva. Dado que o papel das mulheres na reprodução é determinado pela biologia, é algo que não se pode mudar. Em vez de determinar as causas materiais e sociais da origem da opressão feminina, se concentraram em um fator biológico, caindo assim na armadilha do determinismo biológico.
– Em relação a seu papel biológico, se centra na família patriarcal nuclear como estrutura básica da sociedade na qual está arraigada sua opressão. Assim, deram ênfase na oposição à família heterossexual como a base principal da opressão das mulheres. Como resultado, a estrutura socioeconômica mais ampla, onde existe a família e que dá forma à esta, foi ignorada.
– Defender que a contradição entre homens e mulheres seja a contradição principal, concentrando sua atenção no sistema sexo/gênero – os papéis de gênero que homens e mulheres são ensinados a desempenhar. Isto significa concentrar-se nos aspectos culturais e nos aspectos psicológicos da vida social, ignorando as forças políticas e econômicas mais amplas que dão origem à cultura patriarcal.
– Dar ênfase às diferenças psicológicas/de personalidade entre homens e mulheres como biológicos e defender o separatismo para as mulheres. Uma ênfase excessiva à libertação sexual das mulheres mediante criação de grupos separados, arranjos de convivência separada e lesbianismo. Isto significa basicamente que esta seção do movimento de mulheres se limitou a grupos pequenos e não apelava à mobilização da massa de mulheres.
– Cair na armadilha do imperialismo e sua promoção da pornografia, do turismo sexual, etc ao dar ênfase à necessidade de libertar as mulheres da repressão sexual. Ou em nome da igualdade de oportunidades, apoiar a contratação da mulheres no Exército dos Estados Unidos antes da guerra do Iraque (2003).
– A ênfase organizacional em oposição à hierarquia e à dominação se centram em pequenos grupos de tomada de consciência e na atividade alternativa, a qual é autodeterminada, opondo-se à mobilização e à organização da grande massa de mulheres oprimidas.
– Ignorar ou ser parcial às contribuições feitas pelos movimentos socialistas e pelas revoluções socialistas realizadas na Rússia, China, etc, na conquista de mudança de condição de grandes setores de mulheres.
Como a análise teórica incorreta e a estratégia errada pode afetar um movimento negativamente é algo que se pode ver claramente no caso do movimento feminista. A não compreensão que a opressão das mulheres está vinculada à estrutura socioeconômica e política mais ampla de exploração, ao imperialismo, buscou-se soluções dentro do próprio sistema imperialista. Estas soluções têm beneficiado, quando muito, a uma seção das mulheres da classe média, mas deixado a grande massa de mulheres oprimidas e exploradas longe da libertação. A luta pela libertação da mulher não pode ter êxito se a isola da luta para derrocar o próprio sistema imperialista.
Tradução: Alexandra Barbosa
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